Com o advento da Lei 13.058/2014, a guarda compartilhada passou a ser regra no ordenamento jurídico brasileiro, alterando a redação do §2º do artigo 1.584 do Código Civil e determinando a adoção de tal modalidade de guarda mesmo nos casos em que não houver acordo entre os genitores.
Assim, em que pese muitos pais sejam resistentes à fixação da guarda compartilhada – quiçá até por não possuírem esclarecimentos sobre suas reais implicações -, não há dúvidas de que o modelo em questão atende ao melhor interesse da criança e do adolescente e, ao fim e ao cabo, estimula um melhor diálogo entre os guardiões.
Isso porque, ao contrário do que parece, a guarda compartilhada não pressupõe a alternância de residências, mas sim enseja o verdadeiro compartilhamento de tomada de decisões referentes à vida dos filhos, significando, em verdade, uma divisão de responsabilidades de forma igualitária e harmoniosa, por meio da fixação de uma residência-base, podendo ser com qualquer um dos genitores – geralmente com a mãe.
Diante da pandemia da COVID-19 e da imprescindibilidade do isolamento social, passaram a surgir os questionamentos acerca do exercício da guarda compartilhada e da convivência com o guardião que não detém a residência-base do menor, sobre quais as medidas seriam cabíveis em momento tão delicado, que não afastem o direito da prole em conviver com ambos os núcleos familiares, mas que zelem pela proteção da saúde da criança e do adolescente.
A problemática gira em torno da convivência com o outro genitor (antigamente chamada de “visitas”), ou até mesmo cogitar-se a reversão temporária da residência-base da criança, para que passe a ser com o guardião que oferece menos risco de contágio ao menor.
Dessa forma, em homenagem ao verdadeiro espírito da guarda compartilhada, deverão os genitores, com cautela e bom senso, resguardar a integridade física de seus filhos, deixando de lado eventuais conflitos para colocar em primeiro lugar os interesses da parte mais vulnerável da relação, e não os seus.
Quanto à tomada de decisões, mais do que nunca, devem os pais buscar uma solução conjunta e transparente. As tarefas escolares devem ser compartilhadas, a fim de evitar, até mesmo, a sobrecarga de um dos pais e problemas no desempenho escolar da criança.
Na pior das hipóteses, caso o menor necessite de atendimento médico, mostra-se arrazoado que ambos os genitores tomem decisões e participem ativamente dos cuidados com a saúde da criança, mesmos nos casos em que o compartilhamento não for regra.
Além disso, embora tenha caído na usualidade, chamadas por vídeo (através dos mais variados aplicativos disponíveis gratuitamente) possibilitam o contato diário com amigos, familiares, colegas de trabalho, etc. Ou seja, os laços afetivos, ainda que de forma inusitada, mantêm-se solidificados e – diga-se se passagem – passaram a ter maior valor e significado para muitos de nós.
Então, não há razão para opor-se ao contato virtual entre pais e filhos, especialmente nos casos em que as peculiaridades do caso exigirem cautela e afastamento físico – genitores que residem com idosos ou que trabalham com serviços essenciais e não estão em isolamento social.
Como muitos operadores do Direito de Família já destacaram, nenhum acordo ou sentença judicial previram o exercício da guarda e da convivência nesse contexto de pandemia e distanciamento social, o que acaba gerando incertezas aos pais e diversos questionamentos.
De todo modo, ambos os genitores devem construir, por meio de acordo, o exercício da guarda compartilhada e o regime de convívio que vier a melhor atender aos interesses da criança e do adolescente, sendo o bom senso, o equilíbrio e a razoabilidade elementos cruciais neste momento.